segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Negociando para o Brasil - Luiz Fernando Furlan

Saber priorizar é uma das chaves para se conseguir resultados favoráveis em negociações de qualquer área. Discernir qual projeto ou empreendimento vale o esforço e é uma das grandes lições aprendidas por Luiz Fernando Furlan, quando esteve à frente do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

Há questões que não andam. Por isso, antes de gastar energia em um desafio, é preciso reconhecer se o assunto vai patinar sem sair do lugar. Nesse caso, só perdemos tempo”, afirma. Com a experiência de ter protagonizado grandes acordos internacionais brasileiros de 2003 a 2007, quando comandou a pasta do Desenvolvimento, Furlan enumera dois pontos fundamentais para o sucesso em negociações. Em primeiro lugar, quem se senta à mesa de conversações tem de se municiar muito bem com informações relevantes e precisas, além de combinar estratégias claras e definidas com a equipe. “Apenas com essa preparação prévia e com assessores que possam ajudar nas ponderações, você vai ter segurança para argumentar”, explica. O segundo ponto é assumir uma postura autoconfiante, mas sem passar uma imagem prepotente. “Costumo fazer até exercício para isso, para que a minha linguagem corporal mostre segurança e comprometimento durante a discussão das propostas.” O empresário acrescenta ainda uma terceira dica, “mas que depende de pessoa para pessoa”, ressalva: “A cabeça é mais rápida que a máquina. Por isso, pensar rápido, fazer cálculos mentais, por exemplo, pode fazer toda a diferença. Na hora de negociar estabelecer a ordem de grandeza de uma determinada questão é muito mais importante que a precisão milimétrica e pode se tornar um argumento decisivo”.

Elevar as exportações nacionais, de 60 bilhões de dólares, para o patamar dos 100 bilhões de dólares, representou o grande desafio que o próprio Luiz Fernando Furlan se propôs como ministro responsável pelas políticas industriais e pelo comércio exterior. E o administrador foi além: no fim de seu período no governo, as vendas externas se situavam na casa dos 160 bilhões de dólares. De acordo com o empresário, os resultados surgiram justamente como conseqüência de uma maratona de acordos e conversações por todo o planeta. “Tínhamos diretivas simples: vender produtos do país em novos mercados e comercializar novos produtos em mercados nos quais já estávamos presentes”, explica. E acrescenta: ”para isso, tivemos que bater muita perna”. Como resultado, o superávit na balança brasileira apresentou crescimento acima da média mundial por cinco anos consecutivos.

Uma das lições aprendidas com o desafio foi a de “entender o mapa do poder”, ou seja, como costurar apoios fundamentais e, ao mesmo tempo, evitar potenciais resistências. Entre as curiosidades de bastidores, Furlan conta que lançou o programa sem submetê-lo aos demais escalões do governo. “Se o fizesse, perderíamos muito tempo em conversações que só atrasariam o projeto. Mas apresentei o plano ao presidente Lula em encontros informais, que ajudaram as propostas a ganhar força”. Para o ministro, a área pública traz um obstáculo extra na hora de ser pragmático: “A tendência dos políticos é a de se dispersar em discussões pouco práticas, como disputar a paternidade da idéia, quando o que importa mesmo são os resultados alcançados”.

Para Luiz Fernando Furlan, a rodada de negociações com a China da qual participou em 2005, trouxe importantes ensinamentos. “Para conseguir o resultado pretendido, é fundamental descobrir o que o outro lado dá mais valor”, diz. O ministro conta que toda a argumentação dos representantes estrangeiros se voltava para o reconhecimento do país asiático como economia de mercado. A medida poderia prejudicar o Brasil, caso precisasse adotar medidas de proteção contra práticas desleais de comércio por parte da nação oriental. Segundo o ministro, mesmo criticado na época, o processo resultou em um acordo positivo para o Brasil, que conseguiu atrelar um eventual reconhecimento a diversas vantagens comerciais, como a abertura do mercado chinês para produtos agropecuários nacionais e até mesmo a compra de cem aviões da Embraer. Como o acordo não tem validade jurídica, o país fica ainda em posição muito favorável: pode esperar até que todos os benefícios acordados sejam implementados pelo parceiro da Ásia.

As conquistas brasileiras, no entanto, escondem negociações duras. As tratativas com a China continuaram ao longo daquele ano com lances dramáticos. O empresário lembrou-se de um episódio em que praticamente abandonou a mesa de negociações em Pequim, quando percebeu a estratégia chinesa de esfriar as conversações. “Avisei para a equipe reunir as coisas e saímos da sala”, conta, “o ministro do Comércio Bo Xilai me alcançou lá fora e pediu que eu voltasse ao país dali a algumas semanas para continuar a pauta. Então, falei em inglês: 'the distance is the same'(a distância é a mesma). Manter a firmeza da posição e passar esse comprometimento com as demandas foi decisivo. No ano seguinte, o Brasil firmou um acordo no qual a nação asiática se comprometia em adotar medidas de autolimitação de exportações consideradas prejudiciais à indústria nacional, como itens do setor têxtil.




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