sábado, 16 de outubro de 2010

Negociação em família - Deepak Malhotra


Há três tipos de abordagens para a solução de um conflito: direito, poder e interesses. Quais são as melhores e em que situações? As respostas a essas questões foram o foco da palestra de Deepak Malhotra, professor de Harvard.

Especialista em negociação, o pesquisador mostrou que convencer o outro lado a seguir os seus termos nem sempre é a melhor solução Como pano de fundo, Malhotra apresentou uma antiga história que exemplifica um típico embate familiar: o caso das duas irmãs e uma laranja. As meninas têm apenas uma laranja e ambas querem a fruta. Brigam entre si por causa disso e, à medida que elas mergulham no impasse, o conflito vai se agravando. Em um dado momento, o pai entra na história e diz: “Chega, acabou a briga”. Pega uma faca, corta a laranja em duas e dá a cada filha uma metade. E as duas ficam felizes.

O professor de Harvard salientou dois pontos: o primeiro, o processo pelo qual duas ou mais partes, cientes de uma divergência de interesses e/ou perspectiva, tentam chegar a um acordo; o segundo é que duas ou mais partes fazem reivindicações conflitantes.

A primeira abordagem na solução de um conflito é a baseada em direitos: quem está certo e quem está errado. No caso da laranja, podemos avaliar quem encontrou primeiramente a fruta ou quem a comprou. Essa abordagem é útil, mas tem suas limitações. “Frequentemente, achamos que estamos certos, mas o outro lado também”, lembra o pesquisador.

A segunda abordagem diz que não importa quem está certo ou errado, mas sim quem tem mais poder, ou seja, quem pode impor uma solução. Na história das irmãs, a solução foi atingida por uma combinação de direito e poder, representada pela ação do pai.

O uso de uma das duas abordagens nem sempre resulta na melhor solução. Antes de se iniciar uma negociação, é necessário analisar todos os fatores e pontos de vista envolvidos. Para isso, Malhotra apresentou o conceito da Mapan, ou melhor alternativa para uma negociação. É, basicamente, saber qual o melhor cenário, caso não haja um acordo, isto é, o que se perde e o que se ganha. “Você tem de saber o que vai acontecer, se não houver acerto nenhum, mas também saber o que vai conseguir com o acordo e mensurar qual das duas situações é a melhor.” Mas o ponto fundamental é ver também a Mapan da outra parte. Isso vai ajudar o negociador a avaliar se há uma zona de acordo possível: se o resultado vai atender às duas partes.

Para ilustrar como esse enfoque pode mudar para melhor a solução de uma negociação, o professor Malhotra contou um episódio da campanha de Theodore Roosevelt à presidência nos Estados Unidos em 1912.

O diretor da campanha descobriu que cometera um grande erro: não haviam obtido os direitos autorais para usar a foto que estampava um folheto de propaganda. Poderiam ser processados e ter de pagar US$ 1 por exemplar. Para três milhões de folhetos, US$ 3 milhões (que equivaleriam a centenas de milhões hoje). Então o diretor de campanha precisou negociar com o fotógrafo, com base no máximo que estaria disposto a pagar pelo acordo. A Mapan seria jogar fora os folhetos e imprimir novos, o que lhe custaria no máximo US$ 14.000. Ele, então, escreveu um telegrama ao fotógrafo: “Planejando distribuir três milhões de cópias do discurso da campanha com fotografias. Excelente oportunidade para fotógrafos. Quanto você está disposto a nos pagar para usarmos a sua foto?” A resposta: “Eu aprecio a oportunidade; só posso pagar US$ 200”. Foi assim que o fotógrafo pagou a campanha!

O diretor analisou seu Mapan, mas também procurou entender qual valor que os folhetos teriam para o outro lado. “Quanto melhor entender o interesse da parte em conflito, melhor: você cria valor para ela e pode monetizar isso”, explica o professor. O especialista lembra que, para a maioria equivocada, negociar é convencer o outro a fazer a sua vontade.

A terceira abordagem apresentada foi a dos interesses. A despeito dos interesses, o pai precisou usar o poder para resolver a disputa pela laranja. Cada irmã ficou com sua metade. Uma, descascou e comeu; outra, usou só a casca para fazer um bolo. “O melhor resultado da negociação teria sido alcançado, se alguém entendesse o verdadeiro interesse de cada uma em relação à fruta”, analisou Malhotra. Querer a laranja não é o interesse, mas, sim, a posição. “Com frequência as soluções simples baseadas em direito ou poder, acabam com o valor do negócio.”

E acrescenta: “Negociações familiares florescem baseadas em interesses. Nesse cenário, os negócios familiares vão se beneficiar mais do que os outros. Mas a maioria das empresas familiares não tem habilidades para esse tipo de abordagem”.

"Futuro brilhante nem sempre é assumir a posição do pai"

Na segunda parte da apresentação, o professor da Harvard Business School, Deepak Malhotra, respondeu às perguntas da platéia sobre negociação em empresas familiares. Veja as principais questões e respostas.

Meu pai me prometeu uma vida brilhante, mas deixou claro que é impossível para mim assumir o lugar dele, pelo menos antes de sua morte. O que faço?

Não posso dizer que sei a solução do seu problema. Mas existem caminhos melhores que outros. Para lhe dar essa resposta, teria de fazer muitas perguntas e entender o interesse de todos os envolvidos. Mas posso sugerir que você deveria seguir essa abordagem, a de entender o outro lado. O início da pergunta é interessante. Todos os pais querem um futuro brilhante para seus filhos. O que você faz com isso, cabe a você. Um futuro brilhante nem sempre quer dizer você assumir a posição de seu pai.

Temos uma empresa familiar há 16 anos. É estável e lucrativa. Há um ano, estou administrando sozinha nosso empreendimento. Mas, agora, meu pai e meu irmão querem se desfazer da empresa. No entanto, acredito no negócio e quero mantê-lo conosco. Como negociar essa questão?

A sua função nessa negociação não é conseguir com que eles façam o que você quer que seja feito. A sua função é entender por que eles não estão dando valor a você e ao seu trabalho. E o que você pode dar a eles. Mencionei na palestra que pratiquei artes marciais. Meu instrutor trabalhou em um hospital com doentes mentais, que muitas vezes ficavam agressivos. Um dia, o chefe dele perguntou se ele usava artes marciais quando um paciente ficava violento. E ele respondeu: sempre. O chefe ficou chocado e argumentou que ele não podia atacar os doentes. Meu instrutor disse: “A minha paciência para me controlar são as artes marciais, o que me ajuda a entender o que os pacientes estão tentando fazer e não, simplesmente, reagir”. É a mesma coisa na negociação: você deve entender a língua que eles falam, ou seja, ver como eles entendem, de verdade, a situação.

Como negociar com pessoas que mudam seus interesses a cada duas semanas?

Essa é uma situação descrita em meu livro, quando a negociação fica feia, ou seja, como lidar com alguém que não sabe o que quer ou não sabe decidir. Mas você tem de tomar muito cuidado em rotular alguém de irracional. Pode parecer que, frequentemente, seus interesses mudem. Mas você tem de entender os interesses subjacentes. Talvez você esteja concebendo coisas demais e muito depressa para que eles possam apreciar. Ou talvez a outra parte não tenha tido tempo de descobrir o que valorizar. Existe um velho ditado, atribuído a Abraham Lincoln, que diz o seguinte: “Se eu tivesse três horas para cortar uma árvore, passaria duas dessas horas preparando meu machado e não começaria o trabalho, se o machado estivesse cego”.

A solução está em algum lugar e é uma questão de se preparar e imaginar todos os cenários que podem ocorrer.

Nenhum comentário: