sábado, 16 de outubro de 2010

Profissional e de alto desempenho, mas ainda familiar - Pedro Parente


Pedro Parente, o primeiro a se apresentar na tarde do primeiro dia do evento, disse que o sucesso de um líder não pertencente à família proprietária depende tanto do próprio executivo quanto da família.

Pedro Parente foi assim apresentado por John Davis, autoridade no assunto: “É o melhor vice-presidente executivo que conheço”. Após 31 anos de serviço público, e tendo sido Ministro de Estado, Parente assumiu um cargo executivo no grupo RBS, tornando-se o primeiro líder da empresa que não pertence à família Sirotsky. A sua gestão é marcada pelo sucesso. Mas ele deixa claro: “O trabalho que apresentarei é um trabalho de equipe. O mérito é coletivo”.

Parente distinguiu o setor público do privado em termos dos desafios que enfrentou na sua adaptação à nova fase, iniciada em 2002. Foco em resultados, remuneração por mérito e busca por eficiência não são preocupações no setor público, no qual se privilegiam os processos e a estabilidade, e vigora a isonomia salarial. A questão era: “Será que posso dar certo no setor privado?”

O fato é que deu certo, por atributos tanto de Parente quanto da família Sirotsky, que se preparou para recebê-lo. Realizou a institucionalização das três esferas do sistema da empresa familiar: a empresa, a família e a propriedade. Foram criadas instâncias como a assembleia familiar, o conselho de administração e o comitê de cada núcleo familiar. Foi, também, organizada a diretoria executiva.

O alerta que o palestrante deixa é: “Com a institucionalização, estabelecem-se novos papéis para a família, para os acionistas e, em especial, para os acionistas que permanecem como executivos. Os familiares têm de compartilhar o poder, dar espaço e saber ouvir ‘não”.

No RBS, foram elaboradas regras que ajudaram a diminuir a complexidade de situações como a aceitação de um familiar no corpo executivo da empresa ou a dispensa de um familiar. “Se um membro da família não for competente, tem de ser respeitado, mas será desligado. Essas regras me trouxeram muita tranquilidade.”

Além disso, Parente obteve autonomia desde o inicio, já que o poder e as atribuições foram claramente distribuídos e documentados. “Eu e o Nelson Sirotsky, o presidente da empresa, nunca precisamos recorrer ao documento. Só o fato de ele existir era suficiente”, conta o palestrante. A sua relação com Nelson é baseada em confiança, lealdade, sintonia de valores e habilidades complementares.

O mérito do executivo

Tendo o grupo RBS –o terceiro maior grupo de mídia do Brasil– fornecido as condições essenciais, incluindo um pacote atraente de remuneração, Parente pôde mostrar a que veio. Entre seus feitos, está o empreendimento de um sério programa de recuperação financeira, por meio do qual fortaleceu a confiança do mercado em relação à empresa, facilitando o acesso a novas fontes de capital.

Parente considera que o início de sua atuação no RBS foi fundamental para alicerçar o sucesso que obtém até hoje. Ele conta que a chegada de um executivo à empresa familiar deve ser dividida em três fases:

1ª: construção da própria legitimidade, a fim de conquistar a autonomia para realizar mudanças. Parente recorda que sua experiência no setor público ajudou-o a obter a confiança dos familiares e aconselha: “Conheça a cultura antes de propor mudanças e aja pelo conhecimento e convencimento”. Outros conselhos do especialista são: aproveite a prata da casa, compartilhe informações com os acionistas e seja humilde para aprender.

2ª: agregação rápida de valor. Tendo o executivo uma visão isenta, pode fazer um diagnóstico rapidamente. Em pouco tempo, Parente lançou um plano de ações emergenciais para a estrutura de capital da empresa, que estava ameaçada de esgotar o seu caixa em curto prazo, e implantou processos essenciais.

3ª: uso da legitimidade conquistada, para realizar mudanças de médio e longo prazos. Parente o fez baseado em seis pilares: estrutura de capital, gestão estratégica de custos, processos de gestão, atuação no mercado, pessoas e continuidade do crescimento.

O palestrante resume o resultado no seguinte comentário: “É muito bom deixar os sócios felizes, eu recomendo. Mas também deixamos os colaboradores felizes”.

"Nunca demiti nenhum membro da família"

Pedro Parente, vice-presidente do Grupo RBS, finalizou sua participação no Fórum Mundial de Empresas Familiares respondendo a esta e outras perguntas de Marcos Braga, presidente da HSM, e da audiência. Confira aqui os principais pontos abordados.

Como se sentiu na transição do setor público para o privado?

Eu entendia que tinha encerrado um ciclo e isso foi muito importante. Amigos meus sofreram por insistir. Crucial, também, foi reconhecer que o jogo era realmente diferente. Fui acostumado à estabilidade do setor público e, no privado, tinha de entregar resultados. Reconhecer que tinha condições de entregá-los foi importante. Nos primeiros dois anos, passei por alguma ansiedade.

A profissionalização vale para empresas de qualquer porte?

Tudo depende do estágio da empresa. A que está no início, naturalmente, depende mais do desempenho dos fundadores. À medida que evolui da primeira para a segunda geração e, especialmente, da segunda para a terceira, é fundamental que se profissionalize, independentemente do seu porte.

No Grupo RBS, os executivos que pertencem à família são avaliados?

Sim, é padrão. E todos têm o mesmo sistema de metas.

Você já demitiu algum Sirotsky?

Nunca precisei demitir nenhum membro da família, mas alguns se afastaram, porque eles e a família entendiam que deveria ser assim, mas não foi por incompetência.

Como é a definição do seu papel no grupo?

No RBS, há uma separação entre a linha editorial, de responsabilidade do Nelson Sirotsky, e a linha editorial, de minha responsabilidade. Algumas vezes saem notícias que podem afetar um ou outro anunciante. Eu recebo a reclamação do anunciante e digo que somente o Nelson pode resolver assuntos editoriais. Assim, ele fica defendido de pressões dos anunciantes. Mas 99% das solicitações são, na verdade, para não noticiar algo. Maurício, o fundador da RBS, estabeleceu que só ele poderia mudar o conteúdo. Nelson manteve essa posição –só o Maurício pode tirar. Mas, como ele está morto, ninguém mexe em nada.

Como é a preparação de familiares para assumirem posições executivas?

As regras são rígidas. Há uma idade mínima e é exigida uma sólida formação em escola internacional de primeira linha, além de experiência bem-sucedida em outras empresas. Esse profissional deve ser convidado (e não se oferecer) para uma posição que já exista na empresa. Temos, hoje, um único membro da família como executivo, e é ele que está sendo preparado para assumir minha posição. É o Eduardo Melzer.

Qual a razão de sua saída anunciada?

Motivos estritamente pessoais. O caminho natural, em 2010, seria eu assumir a presidência, o que me levaria a ficar mais quatro anos. Entretanto, isso também significaria ficar mais tempo no Rio Grande do Sul ou em Santa Catarina. Minha mulher mora em São Paulo; meus filhos, em outros lugares do País. Eu já estava vivendo na ponte-aérea e achei que seria muito para mim intensificar isso.

Você voltaria a ocupar uma posição no Governo?

Peço aos meus amigos que me internem, se eu decidir voltar.
O Brasil e a Crise - Centro de Liderança Pública


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